quinta-feira, 21 de março de 2013

Trabalhador doméstico: igual, porém diferente.

"Nada mais desigual do que tratar os diferentes como iguais." Não sei de quem é a frase, mas achei apropriada pra ilustrar o que penso a respeito da aprovação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) aprovada por unanimidade no Senado anteontem e que "iguala" os empregados domésticos às demais categorias de trabalhadores brasileiros em relação a direitos trabalhistas. Numa análise rápida e superficial, parece mais do que justa a medida. Afinal, em muitos aspectos eles são exatamente iguais a qualquer outro trabalhador: Cumprem uma jornada de trabalho num local específico, estão submetidos a uma determinada subordinação, recebem uma remuneração, cumprem deveres e exercem direitos. Ok; ponto. Isso os faz iguais. E já fazia antes. O ganho para esta classe agora, então, foi a ampliação dos seus direitos. Ok de novo. Agora a pergunta que não quer calar: Trata-se de uma classe operária exatamente igual às demais? Que batem cartão de ponto; que cumprem horário rigoroso de entrada e saída; que recebem tratamento formal e hierárquico; que são punidos com suspensão ou têm seu "ponto cortado" quando faltam sem apresentarem um atestado médico ou ousam contrariar uma ordem; que cumprem rigorosamente 44 horas semanais de trabalho - o que inclui os sábados -; que pagam ou têm descontada sua alimentação durante o expediente - salvo exceções -; etc.; etc.; e tal...? Quem tem ou já teve empregados domésticos sabe que não. E eles, os trabalhadores domésticos, também sabem. Então aqui vai outra pergunta que não quer calar: Estão estes trabalhadores dispostos a se submeter às mesmas condições de trabalho dos demais trabalhadores - até aqui considerados mais favorecidos e privilegiados? Se sim; que recebam o pacote completo, então: livro ou cartão de ponto para bater, desconto sobre alimentação - que a maioria dos "patrões" não pratica -, o fim das justificativas verbais para atrasos ou faltas; o trabalho aos sábados - que grande parte destes trabalhadores é dispensada hoje, mesmo recebendo por este dia - o cumprimento integral da jornada de trabalho diária - mesmo "tendo acabado o serviço mais cedo"; etc; etc; e tal.
Ora, o Brasil é o país com o maior número de empregados domésticos do mundo, sendo a maioria deles, mulheres (+ de 90%), segundo pesquisas. E boa parte deste contingente de mulheres trabalhadoras, em torno de 7 milhões, ainda segundo pesquisas, precisa pagar outra pessoa (provavelmente outra mulher) para cuidar da própria casa enquanto ela trabalha.
Ou seja; a nova medida trará o fim ou o aumento da informalidade?
Outro ponto importante a ser considerado nesta discussão é a renda média das famílias brasileiras que empregam este profissional e o impacto do custo deste profissional sobre a renda destas famílias - será uma questão apenas de justiça com este trabalhador?
Bom, números e estatísticas à parte, a meu ver a questão mais relevante a esta importante discussão está sendo, ignorada, apesar de óbvia: O trabalhador doméstico é semelhante; mas definitivamente, não é igual a um trabalhador comum. E nada mais desigual do que tratar os diferentes como iguais. Há que se encontrar uma resposta a esta questão, isto é fato; mas respaldo legal não é o bastante. As particularidades do profissional e das condições de trabalho dele precisam ser consideradas e adequadas às leis que regem a sua categoria. A grande pergunta: Como tratar de forma rígida, formal e impessoal uma pessoa que vai ficar mais tempo na sua casa do que você mesmo; que vai preparar sua comida (e não vai poder comer dela?!); que vai cuidar da sua roupa, dos seus móveis; dos seus filhos? Como ser profissional apenas, ao lidar com ela? Como dona de casa, profissional e mãe afirmo que é impossível.. É impossível para as duas partes - empregado e empregador - na prática, adequarem-se a esta nova lei. e regerem suas relações unicamente e simplesmente por ela. Estão subestimando valores intangíveis desta relação, que, quando bem sucedida, na verdade, "não têm preço!" Para as duas partes.
Vanda Souto - 21.03.13.

2 comentários:

  1. É isso, Vandinha, concordo plenamente com sua opinião. Acredito que as relações afetivas não podem perdurar nessa nova relação legal; pois como a sua empregada, lembro bem da alegria com que trabalhava e nos recebia. A Tininha na casa de nossa mãe, é como uma filha, inclusive mais presente nos momentos fáceis e difíceis de nossos pais do que os próprios filhos. Isso pode acontecer, ou seja, uma relação puramente profissional a partir dos novos trabalhadores e empregadores. Abraços!

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    1. Pois é, Beto, só espero que os "novos velhos" trabalhadores também entendam assim. A ampliação dos direitos da categoria amplia também direitos do empregador. É uma contrapartida justa; mas difícil de implementar, dadas as características históricas desta relação. Bjo!

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